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Acórdão do TEDH sobre o caso Barbulescu - Um Big Brother Laboral?
09.03.2016 |
Articles & Briefings
in Advocatus
Desde que foi conhecido, no passado dia 12 de Janeiro, o Acórdão do TEDH sobre o caso Bărbulescu, que se instalou um alarme mediático - ÂEmpresas podem vigiar conversas online dos trabalhadores! - e a discussão em torno do poder de controlo eletrónico do empregador ganhou novo fôlego.
Mas representará esta decisão um precedente de um novo big brother laboral? Podemos esperar dos tribunais portugueses decisões semelhantes?
Vejamos.
A decisão do TEDH Â que legitimou o despedimento de um engenheiro romeno por utilizar, para fins pessoais, no local e durante o tempo de trabalho, um serviço de mensagens instantâneas (Yahoo Messenger) que havia criado por indicação da empresa para dar resposta a solicitações de clientes - assentou em três pressupostos.
O primeiro é o de que o trabalhador sabia que não poderia utilizar o chat para fins pessoais, pelo que não teria uma expectativa de privacidade sobre as comunicações aí trocadas. Entre nós, já desde 2002 que a CNPD se posicionou no sentido de que seria «ilógico, irrealista e contraproducente» uma proibição absoluta do uso privado das tecnologias de informação (TIÂs) fornecidas pela empresa. É hoje pacífico que tem que existir um certo grau de tolerância nessa utilização privada (embora, em nosso entender, devesse ser equacionada a hipótese do empregador poder impor tal proibição relativamente a certas TIÂs implementadas  como um chat  sempre e quando sejam dadas ao trabalhador alternativas de conexão com o mundo exterior).
O segundo é de que seria possível à empresa fazer uma monitorização das conversações mantidas através do chat instalado. E entre nós essa monitorização é possível? E sendo, conhece limites? Um autor espanhol referiu que as novas tecnologias informáticas permitem conhecer a «caixa negra» do pensamento dos trabalhadores, pelo que, embora sendo permitido algum controlo por parte da empresa, este deve ser rigorosamente limitado, sendo vedado, em geral, o acesso ao conteúdo das mensagens. No caso concreto, o TEDH legitimou tal acesso considerando que seria a única forma do empregador comprovar a utilização indevida do chat. Sobre este aspeto, o Supremo Tribunal de Justiça já se pronunciou, proibindo o acesso ao conteúdo de mensagens pessoais do trabalhador «mesmo quando esteja em causa investigar e provar uma eventual infracção disciplinar», acrescentando a CNPD que «não é o facto de certas mensagens ficarem gravadas em servidores da propriedade do empregador que lhe dá o direito de aceder àquelas mensagens, as quais não perdem a sua natureza pessoal ou confidencial». Nas situações de «último recurso» em que se permite o acesso ao conteúdo das mensagens do trabalhador, a CNPD impõe que este seja feito na presença do trabalhador visado e, de preferência, de um terceiro. E se o trabalhador indicar que determinadas mensagens são de cariz pessoal, o empregador não poderá, em caso algum, abri-las.
O terceiro pressuposto em que assentou a decisão do TEDH foi no facto do trabalhador ter tido conhecimento prévio dos termos em que seria feita a monitorização do Yahoo Messenger. Este aspeto foi contraditado pelo trabalhador e pelo Juiz do TEDH Paulo Pinto Albuquerque (o único que votou contra a maioria). E, de facto, não nos parece que o trabalhador tivesse um cabal conhecimento desses termos pois, doutro modo, não teria negado que havia utilizado o chat para fins pessoais. A verdade é que a CNPD impõe que os trabalhadores conheçam, com detalhe, as formas de controlo adotadas, as quais devem ser comunicadas também à CNPD, sob pena de não poder ser feito qualquer controlo.
Concordando, ou não, com a decisão do TEDH, a verdade é que a mesma está francamente desalinhada com o nosso ordenamento, devendo ser recebida pelos tribunais portugueses com especial prudência. As empresas não poderão, por ora, vigiar conversas online dos trabalhadores, nem impor uma proibição absoluta de utilização privada das TIÂs fornecidas aos trabalhadores durante o tempo de trabalho.